Não é o Ocidente colonialista e imperialista que incomoda a Rússia e a China de hoje, conforme os governos ditatoriais desses dois países vêm divulgando a torto e a direito. Ou melhor, esse Ocidente histórico só incomoda em parte: vale dizer, quando as duas potências ex-socialistas e hoje imperialistas começam a disputar espaço com a União Europeia, sobretudo, na cena internacional. Aí, sim, essas potências desfilam suas acusações antiocidentais, manipulando situações reais até.
Com efeito, o quadro nos parece um pouco mais complexo. O fato é que o tipo de capitalismo trilhado por Putin e Xi Jinping é de base autocrática e ultranacionalista, fazendo recordar as opções criminosas dos nazistas (com o perdão do pleonasmo) nos anos 30 na Alemanha. Com um agravante: também na Europa Ocidental de hoje cresce assustadoramente a extrema-direita, com nove partidos comandando ou integrando governos na região. Na América Latina, com as práticas autoritárias em vigor na Argentina de Milei e em El Salvador de Bekele, e a própria consolidação da extrema-direita e do populismo no Brasil, a situação é igualmente muito preocupante. Até porque, os fascistas ameaçam levantar novamente a cabeça no Chile e no Equador. E a eleição de Donald Trump é quase um coroamento desse desmantelamento da ordem liberal no mundo. Alguns governos tendem a ser mais expressões de uma escória humana do que qualquer outra coisa. Não por acaso, a ascensão de Adolf Hitler significou a tomada de poder por um grupo de delinquentes - afinal, era muito mais interessante se apoderar do banco central de um determinado país do que assaltar um banco meio ao acaso. Surgia assim o capital-bandido, esse mesmo que se apresenta controlando cassinos, tráfico de armas e de drogas, investindo na prostituição e em tecnologias que buscam se apoderar de corações e mentes. Uma nova classe dominante vem se formando no mundo, com pretensões de ser uma aristocracia de novo tipo. Essa tendência parte dos Estados Unidos e da Rússia, países não por acaso aliados. Sai do palco a mais-valia e entra o código penal.
E o que é pior: hoje não temos mais a União Soviética como contraponto. Nunca é demais lembrar que a aliança dos comunistas com os liberais derrotou o fascismo, conforme a estratégia política montada pelo revolucionário búlgaro Giorgi Dimitrov, então à frente da Internacional Comunista. Apesar de suas diferenças, liberais e comunistas, como destacava o historiador Eric Hobsbawm, convergiam no tocante à defesa do patrimônio civilizatório. E o embate da Civilização contra a Barbárie voltou à ordem do dia. O enfraquecimento da democracia liberal é o caminho por excelência para o fortalecimento do fascismo mundialmente.
Um quadro, como podemos ver, reunindo elementos tanto da conjuntura que abriu a via para a Guerra de 14-18 quanto para a de 39-45. E não só: com um mundo armado até os dentes, com um arsenal atômico em possessão de governos aventureiros de países localizados em diversos continentes. Decididamente, a Humanidade corre perigo.
Desejaria estar enganado, mas penso que, no fundo, romper com o Ocidente - que não se resume às práticas colonialistas ou imperialistas, como ditadores querem nos fazer crer - é o melhor caminho para o fascismo e a guerra. Mais do que nunca, vamos precisar da união de todos os democratas.
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