O nosso Partido, o Cidadania (antigo PPS), herdeiro do PCB (Partido Comunista Brasileiro), carrega em sua trajetória a resistência à ditadura militar (1964-1985), com figuras como Luiz Carlos Prestes, Astrogildo Pereira, Giocondo Dias,Jaime Miranda, Salomão Malina, Roberto Freire e tantos outros heróis simbolizando perseguição, tortura e morte, na entrega total pela luta fraterna por um mundo de justiça, paz, igualdade, fraternidade e humanismo. Essa memória deveria, em tese, alicerçar um discurso “antiautoritário intransigente” em momentos de crise democrática com ameaças a instabilidade política do País.
No entanto, a crítica aponta que, ao adotar um marketing genérico "partido do bem", o Cidadania esvazia seu potencial histórico de enfrentamento. Em vez de resgatar sua identidade como trincheira contra o autoritarismo, opta por uma comunicação aséptica, evitando polarizações necessárias em um cenário de riscos concretos à democracia (exemplos: questionamentos às eleições, ataques as instituições, desprezo a ordem democrática e tentativa de golpe no 8 de Janeiro).
Por que um partido com DNA da resistência democrática como carrega na sua essência o nosso partido, evita assumir posições contundentes em um momento crítico da vida nacional? Isto reflete o medo de alienar o eleitorado moderado? Falta de projeto político claro? Oportunismo eleitoreiro ou uma guinada para o conservadorismo de direita?
A escolha de utilizar IA no comercial destinado para ser afirmativo partidário, do seu ideário e bandeiras de afirmação política ficou no ar como uma ferramenta do distanciamento e compreendida como uma metáfora da superficialidade. A IA, embora inovadora, tende a generalizar discursos, reproduzindo lugares-comuns ("defesa da democracia", "justiça social", “trabalho digno”, “respeito, amor e liberdade”) sem conexão com pautas específicas ou propostas concretas. Sem projetar nossos líderes, sem estabelecer conectividade na defesa da causa. Isso cria uma ilusão de engajamento, substituindo a profundidade por algoritmos que mimetizam anseios sociais sem enfrentar suas causas estruturais.
Um comercial gerado por IA pode citar "combate à desigualdade", mas não menciona reforma tributária progressiva; fala em "democracia", mas silencia sobre a necessidade de reforma do Judiciário ou do sistema político apodrecido pelas emendas parlamentares secretas que ameaça esta democracia. A tecnologia, aqui, serve como cortina de fumaça para a ausência de conteúdo programático.
O que constamos de forma cristalina é o vazio escapista do "Partido do Bem" como forma de Marketing político versus realidade crua da crise de identidade que assolou a vida partidária que deixa todos estagnados.
A autoidentificação como "partido do bem" é uma estratégia de despolitização. Ao se apresentar como representante do "bem" abstrato, o Cidadania evita
definir inimigos políticos dentro e fora do partido. Afinal quem ameaça o "bem"? Quais grupos ou projetos estão em disputa?
Isso reflete uma adaptação ao neoliberalismo político, onde partidos abandonam ideologias para se tornarem "marcas" que vendem valores universais, mas sem conflito. É uma estratégia de sobrevivência em um sistema político fragmentado, mas que enterra sua razão histórica de existir. E isto não devemos deixar acontecer porque ainda estamos aqui.
O momento exige partidos que denunciem a judicialização da política, com o uso seletivo da lei por falta de um poder legislativo forte que proponha mecanismos de participação popular além do voto. Enfrentem o revanchismo militar, os privilégios dos altos salários e o negacionismo.
Ao não fazer isso, o Cidadania naturaliza a crise, tratando-a como um "desvio" a ser corrigido por instituições, não como fruto de lutas de poder. Essa postura é funcional ao status quo, pois evita questionar estruturas que perpetuam desigualdades e autoritarismos como o papel das Forças Armadas na política. O Ministério da Defesa tem que deixar de ser o sindicato nacional dos militares.
A crise democrática que enfrentamos não pode ter a omissão como escolha. Para o público externo elogiamos o negacionista Trump e referendamos suas maldades catastróficas contra a humanidade. Não podemos ficar entre a memória e o esquecimento.
O Cidadania, ao negar seu passado de resistência democrática, perde a oportunidade de ser farol ético em um cenário de desinformação e ataques à democracia. Sua opção pelo marketing superficial revela uma crise de identidade. Partidos históricos, sem renovação geracional e programática, tornam-se fantasmas de si mesmos.
O medo de praticar a radicalidade democrática tem paralisado e anulado o partido perante à sociedade. Defender democracia hoje exige mais do que retórica; demanda rupturas com pactos elitistas. Por fim, o partido precisa quebrar essa aliança com setores conservadores? É isto que paralisa e influencia a timidez na defesa da democracia.
Esta é a ferida exposta. A omissão do Cidadania não é inocente: é sintoma de uma parcela que, em nome da "moderação", abraça o centro e a direita e se rende ao jogo político tradicional. Resta saber se sua base aceitará essa capitulação ou exigirá o retorno às raízes combativas. Estamos ou não estamos mais aqui? “To be or not to be, that is the question”.
Comments